domingo, 4 de março de 2012

Talvez entenda.

O dia seguia na correria de sempre, mais um dia, um dia a mais ou a menos, nada fora do comum. Pessoas se esbarrando, sem pedir desculpa ou licença. Mulheres reclamando de falta de atenção ou excesso dela. Homens comentando o placar do futebol e julgando o juiz. A insatisfação de sempre, enquanto o sol irritava e a felicidade se camufla. Mas espera um pouco, quem é a menina de vestido? Interessante o cabelo voando, escondendo um sorriso cheio e atrapalhando aquele olhar vazio. Por que ela sorri? O dia tá insuportável e pra completar é segunda-feira. Impossível não reparar na moça, no contraste do batom e o colorido do vestido, sutil e marcante. Talvez não seja a roupa ou a maquiagem, mas essa tranquilidade no meio do caos, esse brilho nas ruas cinzas, por que, menina? Como ela consegue? Muitos olhavam, comentavam, se inquietavam, até que uma menina de no máximo dezesseis anos, com olhos cansados e olheiras fundas, resolveu acabar com o mistério. "- Ei, você! Desculpa o mau jeito, mas preciso saber como você consegue." A moça, surpresa, deu um sorriso simpático e perguntou sem entender "- Como eu consigo o que?" respondeu a outra "Ah, como você consegue isso! Andar reta e não tropeçar. Ser esbarrada e não se incomodar, não fazer cara feia. Pisam no seu pé e você quem pede desculpa. Seu vestido voa e te deixa leve. Seu sorriso é paz. Não te vi reclamando da fila, do calor, dos homens. Você só sorri e anda com tranquilidade e segurança. Mas esses olhos, ah, eles não me enganam, não! Tá vendo os meus? Olho pros lugares e não vejo cor, independente de quantas pessoas estejam ao meu redor, estou sempre só. Não consigo sorrir, ele não me ama mais, nem sei se me amou um dia. E seu olhar não é muito diferente do meu, eu sei. Mas como, me diz como você faz pra viver em paz e não em dor?" A moça abaixou a cabeça pela primeira vez no dia, enxugou a lágrima da menina e sentiu o peso de um desamor em forma de gota. Mas ela já conhecia esse peso, então pegou seu batom na bolsa e deu para a jovem. "- Sabe, é muito difícil aceitar um fim, quando o ponto final não parte de nós. Mas qualquer dor é melhor que ficar sofrendo sempre ao lado de alguém que não reconhece o nosso valor, não faz questão da gente. E ficar fazendo planos e contando sonhos pra uma pessoa que não te inclui nem no plano de ir a uma droga de churrasco é fim. E no início tudo pesa, existir pesa. Mas aí as lágrimas secam e você percebe que nunca foi amor. Nunca foi recíproco. Aí você adiciona na lista de ilusões e foca o pensamento em outras coisas, pessoas, em você. E aprende a se amar sozinha pra nunca mais aceitar ser meio amada e ainda agradecer. Hoje eu ando em paz, porque não caminho mais só ou pela metade. Sempre me acompanho e, antes de alguém elogiar meu vestido ou cabelo, eu já o fiz antes de sair. Tá vendo esse sorriso? Eu protejo mesmo sem vontade, sorrio. Porque minha felicidade é isso, eu, comigo, por mim. E depois que eu entendi tudo isso, todo o resto aconteceu de forma natural. Então passa esse batom e nunca mais deixa ninguém roubar essa paz do seu sorriso, porque nunca vale a pena!" E a moça continuou seu caminho. A menina limpou a última lágrima, passou o batom e seu vestido